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Vivemos num mundo extremamente complexo no qual são incontáveis as variáveis que determinam a nossa condição futura. Este mundo foi-nos dado, estamos todos nele e não há como evitá-lo. Já os nossos pais estavam nele, bem como os nossos avós e todos os antepassados, graças a quem tu estás, neste preciso e especial momento, a ler estas palavras.
Não é que o mundo se tenha tornado complexo nesta geração, pois ele já assim o era. O mundo sempre foi complexo e isso não mudará. Esta complexidade do mundo, da vida, dos relacionamentos e das próprias questões fundamentais da existência humana, desorienta as pessoas, assustando-as e deixando-as confusas relativamente ao rumo a tomar neste oceano de infindáveis oportunidades chamado vida.
Para além da confusão natural, tremendamente sentida na adolescência, fase em que a individualidade de cada um se sobrepõe à vontade parental naturalmente instituída desde o nascimento, muitos de nós, infelizmente, não tiveram modelos parentais ideais que poderiam eventualmente ter sido um fator de diminuição dessa confusão ou desorientação inerente à vida. Quando assim é, quando uma criança é educada por pais incapazes de educar, estando eles mesmos confusos sobre a vida, essa criança pode transformar-se num adolescente problemático para ele mesmo e para a sociedade.
Quero dizer e tornar claro que acredito que qualquer pai ou mãe quer dar o seu melhor e que faz tudo o que está ao seu alcance para ser um bom educador. Contudo, há uma diferença entre querer ser um bom educador e conseguir sê-lo. Para se ser um bom educador não basta querer, é necessário também aprender. Para além disso, é preciso ainda consumar a educação, educando de facto e também levar uma vida que sirva de exemplo, na qual as ações do educador são a luz orientadora para quem vem atrás.
O futuro da humanidade são as crianças. Elas são puro potencial criativo que um dia se manifestará. Se queremos bons pais, bons educadores, então, necessariamente, teremos que educar bem as nossas crianças, para que elas se tornem também em bons educadores e bons pais.
A resposta não é linear nem simples. De facto, nós, humanidade, ainda estamos a descobrir como educar bem as nossas crianças. O mundo muda, evolui, traz situações que não existiam no passado e coloca-nos constantemente em posições novas e desafiantes. Há 100 anos atrás a discussão sobre as mudanças climáticas não era assunto de interesse público, mas hoje é! Há 30 anos atrás não se falava dos perigos inerentes à internet e às redes sociais, mas hoje em dia todos estamos preocupados com isso. Com a mudança veloz das estruturas do mundo, os modelos educacionais das nossas crianças ficam rapidamente ultrapassados, porque a nossa sociedade é tecnológica, é de informação e cavalga quase tão rápido como o próprio tempo, tornando esses modelos forçosamente obsoletos.
Os Yogis sábios da antiguidade sabiam que os valores éticos e morais são a estrutura que sustenta a paz entre os humanos. Algures, no grande épico Mahābhārata, ocorre a popular frase “ahiṁsā paramaḥ dharmaḥ” – a não-violência é a maior virtude, é o maior valor. Os Yogasūtras, no sūtra 2.30, também mencionam este valor como um dos yamas, disciplinas comportamentais nas quais nos abstemos de algo. Para a pessoa que estude Vedānta o valor da pacificidade também é conhecido e denotado pelos Mestres como sendo de suma importância. Então, este é, sem dúvida alguma, um valor a ser ensinado a todas as crianças do mundo.
A definição em sânscrito é a seguinte –
A reflexão nesta ideia deverá ser encorajada a todas as crianças e deverá ser acompanhada da lembrança das emoções sentidas quando a criança se sentiu violentada. O valor da paz só poderá ser verdadeiramente valorizado quando se torna um valor para o próprio, portanto, quando o próprio o valoriza. O mecanismo é ironicamente eficaz, pois tendemos a valorizar a paz somente quando a perdemos. Então, há que trazer à memória a perda dessa paz juntamente com as emoções consequentes. Depois, há que fazer ver a essa criança que todos queremos paz, que não é somente ela que quer paz e que, se todos formos mais pacíficos, todos teremos mais paz. A criança terá que entender que se cada um contribuir com a sua parte da paz, a paz cresce para todos. A contribuição individual resulta num benefício coletivo bem como individual.
Não é à toa que a tradição Védica nos ensina que o valor da pacificidade é o mais exaltado. A razão para isso fica clara quando se entende que a paz é o tecido onde reside a harmonia individual, familiar, social e mundial. Sem paz individual não há paz familiar., sem paz familiar não há paz social., sem paz social não há paz mundial.
A não-violência tem duas direções, a primeira é interna, a segunda é externa. A não-violência interna é a prática da pacificidade com o complexo corpo-energia-mente. A não-violência externa é a prática da pacificidade com o mundo externo, em todas as formas no qual está manifesto.
Na primeira, interna, a pessoa deverá aprender a aceitar inteligente, objetiva e pacificamente as suas próprias limitações, entendendo que ultrapassar os limites do seu complexo corpo-energia-mente é um ato violento. Ir além dos limites razoáveis que cada um tem, põe em risco a saúde física, a saúde energética e mental. Então, quando se pensa em não-violência, deverá ser incluída a componente fundamental da relação consigo mesmo. A relação consigo mesmo deve ser não-violenta. O resultado a médio-longo prazo de se relacionar não-violentamente consigo mesmo é chamado maturidade emocional, algo tremendamente desejável para todos os seres humanos. Quanto mais cedo na vida a pessoa se torna madura emocionalmente, menos se violenta a si mesma e naturalmente menos violentará os demais. Isso é muito desejável tanto a nível individual quanto coletivo.
Na expressão externa da não-violência criamos um ambiente onde a segurança individual aumenta, porque os demais não se sentem ameaçados com a nossa conduta. Com isso vemos pessoas mais relaxadas, calmas e com níveis de stress baixos. Num lugar onde o índice de violência é baixo, as pessoas naturalmente sentem-se mais conectadas, livres e à vontade para serem quem são, expressando os seus talentos e virtudes sem medo de represálias ou ameaças. Por outro lado, vemos que um ser humano inserido num ambiente continuamente hostil desenvolve traumas, medos, ansiedades e cria, consequentemente, um comportamento reativo-defensivo como resposta. Ele deixa de poder expressar as suas virtudes em função da necessidade instintiva de se proteger, porque muita da sua energia é empregue na sua proteção. Para além disso, tendencialmente a violência é respondida com violência, o que gera mais violência. É como gasolina atirada para uma fogueira! O efeito é catastrófico.
Alinha-te pela paz. Amorosamente, sê pacífico contigo mesmo e com os demais seres que partilham a vida aqui na Terra contigo.
Viver implica escolher, simplesmente porque a vida é feita de escolhas sucessivas. A cada momento é esperada de mim uma escolha, uma decisão, que afetará inevitavelmente o meu futuro, para melhor ou para pior. O que nos une em todas as decisões que tomamos é o desejo por uma vida melhor, mais sábia, mais rica e mais realizada.
Contudo, se olharmos para a vida de outras pessoas, ou mesmo para as nossas próprias vidas, reparamos que as nossas escolhas ou decisões nem sempre nos colocaram na melhor posição ou na posição que realmente desejamos e muitas vezes damos por nós arrependidos ou culpados e consequentemente revoltados, ou simplesmente tristes e desapontados porque tomamos uma má decisão.
Para algumas pessoas, as más escolhas ou decisões são de tal forma abundantes, que a vida delas é um autêntico drama repleto de sofrimento e arrependimento. Tais pessoas vêem-se constantemente presas num ciclo destrutivo, numa espiral descendente de más decisões que levam a mais más decisões e que consequentemente as colocam em posições extremamente indesejáveis e muito perigosas. Exemplo disto são as pessoas dadas ao crime. Para outras, parece haver uma predominância de boas escolhas, que levam a mais boas escolhas, permitindo-lhes desfrutar plenamente da vida em todas as suas áreas e usufruir do melhor que a vida tem para oferecer.
Somos dotados da capacidade de sentir emoções, o que faz de nós seres emocionais, porém somos também dotados da capacidade de pensar racionalmente, por isso também somos seres racionais. Por vezes, direi mesmo muitas vezes, existe um conflito interno no momento de decidirmos. Como?
Racionalmente sabemos o que é melhor para nós, até porque muitas vezes isso é simplesmente óbvio e muito claro, contudo, emocionalmente somos empurrados para uma decisão contrária. Darei um exemplo que ilustra bem esta situação. O almoço está simplesmente uma delícia e tu comes com muito prazer. A certa altura, terminas o que está no prato e sentes-te plenamente satisfeito, o que indica que já não é necessário alimentar mais o corpo, pois ele já deu sinais de que a quantidade de comida foi suficiente. Porém, como a comida está tão deliciosa, o desejo por comer mais empurra-te para encheres e de novo o prato e repetires a dose. No final da refeição, em vez de te sentires satisfeito, sentes-te empanturrado, ligeiramente indisposto e também culpado ou arrependido. Situações como esta são muito comuns, sabemos aquilo que é certo e acabamos por fazer o que é errado. Se continuares a cometer o mesmo erro, ou seja, se persistires em comer demasiado em todas as refeições, ganharás peso e provavelmente problemas de saúde relacionados com o aumento de peso e não é isso que realmente desejas.
Neste caso, é o teu desejo ou amor à comida que se sobrepõe ao teu pensamento racional e na linguagem técnica de Vedānta dizemos que foi uma decisão baseada em rāga, o desejo intenso de obter algo de que gostamos muito e que causa algum tipo de sofrimento se não for realizado.
Por vezes a decisão não é motivada por rāga, mas sim por uma aversão. A palavra sânscrita para aversão é dveṣa. A aversão é um desejo intenso de afastar ou fugir de algo de que não gostamos, de algo que odiamos. E assim como um rāga, o desejo intenso de possuir algo, turva a racionalidade da mente, empurrando para uma decisão que no fundo a pessoa não quer tomar, também um dveṣa turva a mente.
Como? Darei mais um exemplo. Supõe que é o aniversário de um familiar teu de quem gostas muito. Haverá uma festa de aniversário para a qual foste convidado e queres muito ir, não apenas para felicitar o aniversariante, mas também porque irás encontrar lá pessoas queridas com as quais não tens um contacto regular e assim poderás pôr a conversa em dia. Uns dias depois, em conversa com outro familiar, descobres que também vai a esse mesmo aniversário uma pessoa que tu não toleras, porque a consideras muito arrogante e até já foi indelicada contigo várias vezes em várias ocasiões. Reconheces que tens um dveṣa muito forte relativamente a esta pessoa, porque sentes-te muito desconfortável na presença dela e tens emoções desagradáveis quando a vês. Faltam dois dias para o aniversário e tu ainda não deste a resposta afirmativa ao convite porque estás num dilema – ir ou não ir.
O lado racional apresenta-te a escolha certa: “é tão agradável festejar o aniversário, rever antigos amigos, conviver e ser feliz com eles, eu também adoraria a presença dos meus familiares e amigos no meu aniversário”, porém o lado emocional conta outra história: “aquele fulano que eu detesto vai estar lá e tenho a certeza que se vai dirigir a mim propositadamente para me arreliar e envergonhar à frente de todas as pessoas só porque sou vegetariano e espiritual e eu sei que não vou conseguir agir calmamente e também sei que ficarei chateado depois”, por isso “penso” que o melhor é não ir.
Este é um dilema muito comum cuja análise torna claro que a oportunidade de seguir o svadharma, o dever próprio, ou seja, fazer aquilo que deve ser feito, se pode perder quando a mente fica turva pelos dveṣas. Portanto, rāgas, desejos intensos e dveṣas, aversões intensas, são um dos fatores que nos levam a tomar más decisões, aos quais temos que estar atentos e para os quais o antídoto é Karmayoga.
Outro dos fatores para as más decisões é a falta de informação ou informação errada. Para tomarmos uma boa decisão é importante estarmos bem informados sobre as opções que temos, por isso informa-te devidamente antes de tomares uma decisão ou fazeres uma escolha. Normalmente, a falta de informação na tomada de uma decisão é devido à impulsividade, que é o impulso brusco e quase inevitável de tomar a decisão naquele preciso momento sem poder esperar e decidir mais tarde. Se tiveres a opção de poder decidir mais tarde, sem que isso reduza significativamente as tuas opções, então decida mais tarde, pois terás mais tempo para te informares.
Informa-te sempre com quem é da tua confiança, com quem sabe do assunto em questão e, muito importante também, que seja uma pessoa neutra relativamente à decisão e ao seu resultado. A neutralidade do teu informador perante a tua decisão é importante, pois assim terás a certeza que os conselhos ou sugestões que te dará não serão motivados por um interesse pessoal.
Agora falar-te-ei um pouco de Viveka, uma qualidade, um fator ou capacidade imprescindível para tomar boas decisões. Viveka é comumente traduzido como discernimento ou como discriminação. A palavra viveka é composta pelo prefixo “vi”, pela raiz verbal “vic” (vicir) e pelo sufixo “ghañ”. O prefixo “vi” significa viśeṣeṇa, de forma especial ou abundante. A raiz verbal tem o significado de distinção, dividir, separar. O sufixo “ghañ”, confere o mero significado da ação indicada pela raiz. Esta foi a vyutpatti, a etimologia da palavra.
Agora, para entendermos mais sobre viveka, gostaria de partilhar contigo duas definições gerais da palavra em Sânscrito:
1 – परस्परव्यावृत्त्या वस्तुस्वरूपनिश्चयः इति विवेकः, viveka é vastu-svarūpa-niścayaḥ, a determinação acerca da verdade de um objeto, paraspara-vyāvṛttyā, através da separação um do outro. Quando fazes um puzzle aplicas este método, separando as peças pelas cores e pelos formatos.
2 – याथार्थ्येन वस्तुस्वरूपावधारणम् इति विवेकः, viveka é vastu-svarūpa-avadhāraṇam, a determinação da natureza ou verdade de um objeto, yāthārthyena, assim como realmente ele é. Neste momento estamos a ter viveka sobre a palavra viveka, pois estamos a descobrir o que realmente significa viveka.
Ambas as definições são muito reveladoras. Através da primeira, entendemos que viveka é o processo pelo qual podemos separar ou distinguir duas coisas quando estas estão misturadas. A segunda indica o conhecimento conclusivo acerca da natureza real de um dado objeto. Se juntarmos estas duas belas definições vemos que viveka é o processo de distinção ou separação de duas coisas quando estas se encontram separadas e é também o resultado na forma do conhecimento conclusivo acerca de ambas as coisas que foram separadas.
Este discernimento de que se fala aqui é a capacidade que tu e todas as pessoas já têm e que precisa ser treinada e devidamente desenvolvida para poder ajudar na tomada de boas decisões. Para isso, aprende a separar a tua mente racional da mente emocional. Analisa se estás a pensar corretamente e verifica se as tuas emoções estão a turvar o teu discernimento. Identifica essas emoções e diz a ti mesmo que as emoções são válidas e fazem parte da tua mente emocional e que não estás mais disposto a tomar decisões baseadas nos teus rāgas e dveṣas.
Gostaria também de te dizer que uma das formas de aumentarmos o nosso poder de discriminação é a prece. A prece é um pedido a Īśvara, o Absoluto, por algo que queremos ver realizado. Pede a Īśvara para ter mais Viveka e para que as tuas escolhas sejam sempre um reflexo desse precioso discernimento.
Existem situações em que a escolha não é entre algo apropriado ou inapropriado, ou seja, não é entre o dharma e o adharma, nem tão pouco é influenciada por emoções que turvam a capacidade de decidir. Essas são situações em que a escolha ou decisão é entre algo que será melhor ou pior para ti, mas que tu no momento da decisão desconheces o resultado. Nesse caso, aprende a centrar e a seguir a tua voz interior. Por detrás da mente racional esconde-se, por vezes, um saber intuitivo sobre a melhor decisão a tomar. Esta capacidade de tomar decisões com base na intuição, ou no instinto, apesar de ser arriscada, é seguida por muitas pessoas de forma não deliberada, como por exemplo, por homens de negócios, que confiam no seu “instinto” de negociadores-
Estas foram algumas dicas para obtermos mais viveka no nosso dia a dia para assuntos práticos. Gostaria ainda de mencionar que viveka é uma das qualificações que qualquer aluno de vedānta precisa de desenvolver para ter sucesso no estudo, que passa por puruṣartha-niścaya, pelo discernimento do verdadeiro objetivo da vida, chamado mokṣa.
No decorrer do estudo de Vedānta, ou até do Yoga, geralmente os alunos deparam-se com uma prática de meditação muito específica chamada “mantra-japa” ou simplesmente “japa”. Japa vem da raiz verbal “jap”, que significa dizer. Mantra-japa significa dizer um mantra. Este “dizer” poderá ser alto, murmurado ou então mental. Contudo, geralmente está implícito que esse “dizer” seja um dizer repetido, ou seja, japa significa repetir diariamente um determinado mantra por um determinado período de tempo ou então repetir um determinado número de vezes estipulado pelo professor ou pelo próprio praticante.
Para além de ser uma prática de meditação específica, japa é também um compromisso que a pessoa assume perante ela mesma e perante o professor, com vista a desenvolver certas características mentais importantes para o estudo de Vedānta e também para a vida.
Porque é necessário ou importante fazer japa, repetir um mantra? Uma das razões é que sem esta prática específica, é muito difícil gerir os pensamentos, é muito difícil ter uma palavra a dizer sobre o fluxo mental. Como? Vamos ver.
Quando o praticante repete um mantra, por exemplo “oṁ īśāya namaḥ”, que significa literalmente “saudação para īśa” – (īśa é um dos nomes de Śiva e representa o Absoluto) – ele ocupará a sua mente somente com esse mantra, que será o seu pensamento deliberadamente repetido. No processo de repetição do mantra e no processo da aquisição da mestria da prática de japa, a pessoa nota, primeiramente, que a mente se distrai com muita frequência e depois aprende algo fundamental sobre a mente – a tendência natural da mente é a distração. Depois, se for um praticante atento, notará que a mente geralmente pensa os mesmos pensamentos todos os dias, portanto notará que a mente pensa pensamentos recorrentes.
Dentro do contexto da prática de japa, todos os pensamentos, recorrentes ou não, que não sejam o mantra, são considerados distrações e, portanto, não são para lhes darmos corda. Ou seja, se a pessoa dá conta de que se distraiu a pensar nas compras para o jantar, ou no companheiro, ou no filho, ela deverá parar de entreter esses pensamentos que saem fora do âmbito da meditação e voltar à repetição do mantra. Este processo de “voltar ao mantra” deve ser feito com muita compaixão e paciência e a pessoa não deve criticar-se negativamente por sentir dificuldade em manter a mente focada na repetição do mantra. A realidade é que nos primeiros tempos da prática, japa não é fácil e pode até ser frustrante, contudo, os resultados desta prática valem bem o esforço!
Assim sendo, é muito importante a prática de japa, porque a pessoa fica munida da capacidade de manter a mente focada em qualquer coisa e em qualquer altura. Esta capacidade de foco unidirecional é chamada de ekāgratā e é muito importante para o estudo de Vedānta, no qual a atenção auditiva do aluno e a disponibilidade da mente em permanecer com essa atenção é tremendamente precisa. Se esta atenção não estiver presente, haverá muitas distrações durante a aula sem que a pessoa as note, o que se traduzirá numa perda de muito conteúdo importante para o aluno.
Assim é porque as aulas de Vedānta seguem uma linha de comunicação construtiva e progressiva onde cada ideia comunicada é substanciada pela ideia anterior e assim sucessivamente. A aula é como um caminho que o professor faz de mão dada com o aluno, mostrando-lhe as várias nuances da vida, da humanidade e da realidade. Se a dada altura o aluno se distrai sem se aperceber, é como se ele soltasse involuntariamente a mão do professor e fosse noutra direção, perdendo de vista todas as nuances importantes para as quais o professor aponta. Com isso ele perde o fio condutor da aula e a mensagem falha o alvo, porque não encontra um recipiente válido onde ficar e isso não é desejável, obviamente. Por esta razão japa é importante.
Agora, se estendermos o que se passa com um aluno distraído durante a aula à vida desse aluno, facilmente entenderemos que ele terá muitas distrações. Estará a falar com alguém, mas a pensar noutra coisa, não ouvindo direito o que lhe é dito, o que causa inúmeros problemas comunicacionais. Vejam aqui e agora que japa ajuda-nos a comunicar melhor. Ajuda-nos a ouvir, ajuda-nos a estar presentes na audição.
Outra importância do japa é a conexão com a deidade invocada pelo mantra. Essa conexão é importante, porque a deidade ajudará a pessoa, especialmente nos momentos difíceis. As deidades são nutridas pelas ofertas e pelos mantras e em troca nutrem-nos. Por outras palavras, a repetição de um mantra traz puṇyam e esse puṇyam ajuda a pessoa a viver melhor. Isto também é desejável e importante.
Tenho constatado através de relatos de vários alunos iniciados por mim em mantra japa, e, claro, também pela minha própria prática pessoal de mantra, que a capacidade para ultrapassar problemas emocionais aumenta consideravelmente. Isso dá-se não só pela graça, pelo puṇyam que a pessoa ganha para si pelo seu próprio mérito, como também pela graça que é passada com a iniciação do mantra. Para além disso, algo também muito importante acontece num praticante experiente de japa – o nascimento de uma mente meditativa, o nascimento de uma mente sāttvika.
Numa mente assim todos os estados emocionais são acolhidos, pois quem tem uma mente assim aprendeu muito bem a observar a sua própria mente e sabe muito bem que ela é é um mero instrumento ao dispor de quem o usa, aliás, como qualquer outro instrumento. Esta mente contemplativa é um ganho muito desejável para qualquer pessoa, mas ainda mais desejável para um aluno de Vedānta e representa que o instrumento chamado mente está bem “calibrado” ou “afinado”.
Se a prática de japa for bem executada, com calma, perseverança, paciência, com a correta pronúncia e entoação, com a rapidez adequada, os resultados são visíveis em poucas semanas.
Boa prática!
Os humanos têm algo de muito profundo em comum – todos querem ser felizes. Se analisarmos a nossa vida e a vida das pessoas que nos rodeiam, como por exemplo a das que são mais significativas para nós e que estão mais perto, como os pais, o companheiro ou a companheira, os filhos, etc., certamente repararemos que todos tentamos fugir ou evitar as situações que trazem infelicidade, e também que todos temos uma atração especial por situações que nos trazem felicidade.
Por mais simples que possa parecer, a vida é essencialmente pautada por estas duas buscas: a primeira está na forma de negação ou o evitar de situações que nos fazem infelizes, a segunda é a busca por situações que nos fazem felizes.
Uma análise mais cuidada a estas duas buscas, que na realidade são uma só – a busca por felicidade – leva-nos à conclusão de que a felicidade é vista como o produto ou a consequência de uma ação, ou de um dado acontecimento ou evento. Assim sendo, a felicidade torna-se dependente do sucesso dessa ação ou de determinado evento, situação, etc. e então estaremos sempre dependentes de algo para sermos felizes, o que é, em si mesmo, um jogo muito arriscado que a maior parte das vezes não ganhamos, simplesmente porque o mundo é instável e imprevisível.
Se o mundo e as pessoas fossem realmente previsíveis, então poderíamos prever como e quanto seríamos felizes. Porém, esse não é o caso. As situações inesperadas tanto nos atiram para cima, enchendo-nos de exaltação e euforia, como nos atiram para baixo, inundando-nos de tristeza e depressão, fazendo com que a vida pareça um autêntico ioiô ou mesmo uma montanha russa.
Uma verdade acerca da busca por felicidade que precisa de ser conhecida é o senso de completude ou de plenitude que existe num momento de felicidade. Todos já experienciamos essa plenitude ou realização, por outras palavras, todos já nos sentimos completos num ou em vários momentos das nossas vidas. Isso acontece porque a felicidade manifesta-se como a sensação de plenitude, a sensação de que não nos falta nada, de que não carecemos de nada. Porém, essa experiência é passageira e assim que passa, a pessoa volta ao que era. A pessoa volta a sentir carência, volta a sentir um vazio, volta a sentir que algo não está bem.
Gostaria agora de olhar para esse vazio ou senso de carência e dizer ao leitor porque é que ele existe. Esse senso de carência, de insuficiência, de vazio, como quiser chamar-lhe, é sempre referente a algo, está sempre relacionado com um dado aspeto ou esfera da vida.
Muitas pessoas sentem um senso de insuficiência relativamente ao seu corpo. Sentem que não são suficientemente bonitas, bem feitas, fortes, etc. Este é um senso de insuficiência centrado no corpo, que é muito comum. Isso significa que as pessoas não estão em paz, ou que não são felizes com o corpo que têm e que procuram a todo o custo mudá-lo, para que, aos seus olhos, ele se torne suficientemente bom e esteja à altura das expectativas, próprias e sociais.
Outro senso de insuficiência é centrado na energia e na saúde. Ninguém gosta de se sentir cansado e sem energia, assim como ninguém gosta de se sentir doente. Então, em questões de saúde e de energia, há um senso de insuficiência. É por isso que existem pessoas obcecadas pela saúde e por energia. As primeiras vivem obcecadas com todo o tipo de terapias, para que nada “lhes pegue” e as segundas poderão ser viciadas em café, substâncias melhoradoras de desempenho, drogas, ou mesmo viciadas em contacto social de onde extraem a sua energia.
Ao nível emocional também existe um senso de insuficiência, ou de incapacidade, pois as pessoas debatem-se de forma exaustiva com as suas próprias emoções, desejando a todo custo ficar livres das emoções ditas indesejáveis, como a raiva, a tristeza, o medo, etc. Isso significa que a nível emocional as pessoas gostariam de ser diferentes e que sofrem porque não o são.
Cognitivamente a insuficiência também é notada e isso é visto com clareza nas escolas e universidades, onde os alunos se debatem entre si numa competição subtil para serem os melhores, lutando diariamente com as suas limitações, no que diz respeito à inteligência, à memória, à forma como estruturam a linguagem, etc. Face a estas limitações existe um senso de insuficiência ou incapacidade que torna as pessoas insatisfeitas e consequentemente infelizes.
Porque é que este senso de insuficiência, de incapacidade, ou mesmo de vazio existe?
Este senso existe, porque para a grande maioria das pessoas, o senso de identidade, o senso de “eu”, reside somente no complexo corpo-energia-mente-personalidade. O pensamento da maioria das pessoas é: “eu sou este complexo corpo-energia-mente-personalidade, portanto sou tão bom ou tão mau quanto for bom ou mau o meu corpo-energia-mente-personalidade”. Se o corpo é feio, a pessoa considera-se feia, e sofre, claro, porque o senso de insuficiência respeitante à beleza existe e a pessoa não suporta essa insuficiência. Se existe pouca energia, a pessoa rotula-se como cansada, precisamente porque existe um senso de insuficiência respeitante aos níveis de energia ou vitalidade e a pessoa fica infeliz. Se existem frequentemente emoções indesejáveis, a pessoa considera-se emocionalmente fraca, emocionalmente insuficiente, acabando por se sentir ainda mais triste. Se a pessoa não tem um bom desempenho a nível intelectual, então poderá ser rotulada como pouco inteligente e, assumindo para si esse rótulo, sofre por se ver como insuficiente no que diz respeito à sua inteligência ou às suas faculdades cognitivas.
Um facto importante que tem que saber acerca do complexo corpo-energia-mente-personalidade é que ele será sempre limitado. Por isso, por mais que o tente mudar, por mais que o tente melhorar, ele será sempre limitado.
Porém, algo profundamente libertador existe na apreciação de que o limitado complexo corpo-energia-mente-personalidade não é tudo acerca de mim. Existe uma presença testemunha consciente de todos os fenómenos corpóreos, energéticos, mentais e cognitivos. Essa presença tem que ser apreciada e entendida como mais profunda do que o superficial complexo corpo-energia-mente-personalidade. Há que descobrir que essa presença não carece de nada, sendo a testemunha, sendo consciente de todas as carências. Enquanto a natureza desta consciência não for conhecida como o eu verdadeiro, a pessoa continuará a viver com o senso de “eu” centrado no complexo corpo-energia-mente-personalidade, portanto continuará a viver centrada nas limitações do corpo, etc.
Então, é o desconhecimento do verdadeiro “eu” que constitui o problema fundamental do ser humano. Desconhecendo quem realmente são, portanto, desconhecendo que na realidade são a consciência testemunha dos pensamentos, emoções, memórias, sensações, etc., e mais importante ainda, desconhecendo a natureza dessa consciência, cometem o erro fundamental e universal, que é concluírem que apenas são o limitado complexo corpo-energia-mente-personalidade. Assim sendo, atribuem ao “eu” verdadeiro, consciência, todos os atributos e características do corpo, sofrendo por causa disso.
Este problema é fundamental pois diz respeito à pessoa fundamental, o “eu verdadeiro”, a consciência. E este problema é universal porque em todos os lugares as pessoas nascem com este desconhecimento ou ignorância acerca da verdade de si mesmas.
Se o problema é a ignorância, a solução terá forçosamente de ser o conhecimento. Neste caso concreto, como a ignorância é sobre quem eu fundamentalmente sou, portanto, é acerca da pessoa fundamental, o conhecimento terá que ser o da pessoa fundamental, chamado ātmajñānam, o conhecimento do Eu. Assim sendo, a solução também é universal, pois a única solução para a ignorância é o conhecimento e este facto é universal.
Aquecer o forno a 200 graus e untar ou pincelar muito bem com óleo de amendoim (aguenta bem altas temperaturas) uma forma de bolos.
Esmagar muito bem com um garfo 3 bananas médias muito maduras.
Misturar numa taça 125 gr de farinha com 125 gr de farinha integral e 125 gr de açúcar mascavado. Misturar também 2 colheres de sopa de fermento, raspa de limão e uma pitada de sal.
A seguir, abrir uma cova no meio e juntar os húmidos: 100 ml de azeite ou óleo de amendoim, 1 copo e meio de iogurte natural de soja (cerca de 150 ml) e a banana esmagada.
Diminuir o forno para 180 graus, deitar a massa na forma e levar a cozer durante cerca de 50 minutos. Experimentar com um palito, antes de retirar do forno.
Deixar arrefecer até poder manipular a forma sem se queimar, antes de o desenformar.
Pode-se comer morno ou frio, polvilhado com canela, com uma colherada de natas de soja batidas em chantilly e frutos tropicais.… ou simplesmente assim, apreciando o sabor quente da banana.
Bom apetite!

A comida persa tem sabores suaves e mistura sem desculpas frutos secos e sumarentos, raízes, iogurte e flores. Nutritiva para o corpo e para os olhos, só precisa de algumas adaptações para retirar as opções animais e nutrir também a mente.
A propósito do Nowruz, a festa zoroastra que no Irão festeja o equinócio da Primavera, fiz uma refeição que é muito comum no Irão: espetadas com pão, arroz, um belo borani (salada cozinhada), e ainda uns bolinhos de tâmaras. Tudo bem saboroso, mas de paladar delicado. As receitas foram simplificadas ao máximo e começamos pelas que se podem/devem fazer no dia anterior: o borani e os bolinhos de tâmaras.
Para o borani chogondar, que fica bem melhor feito de véspera, precisamos de uma beterraba cozinhada, 1 colher de chá de alho muito picadinho, 2 copos de iogurte de soja sem açúcar, azeite, sal, pimenta preta e menta (de preferência fresca) picada.
Pode assar a beterraba no forno embrulhada em papel de alumínio ou cozer a vapor. Deixar arrefecer, descascar e ralar grosseiramente. Misturar com os restantes ingredientes e colocar no frigorífico durante, pelo menos, duas horas. Servir com um fio de azeite e um pouco de menta por cima.
20 tâmaras sem caroço, um copo de nozes (também pode usar pistáchios ou avelãs), 3 gotas de essência de baunilha ou de limão, açúcar em pó e pistáchios (ambos opcionais).
Deixar as tâmaras de molho em água a ferver durante 20 minutos. Entretanto, desfazer as nozes no processador de alimentos e juntar a essência. Juntar as tâmaras e desfazer até obter uma pasta grossa e moldável. Pode rebolar em açúcar em pó e decorar com pistáchios – ou não.
Uma embalagem de espetos de madeira ou bambu, uma caixa de tomates cereja, um pacote de seitan (prefira sempre o refrigerado – o de longa duração parece borracha!), uma cabeça de alho. Precisamos ainda de azeite, pimenta preta, 1 limão, coentros e cebolinho (opcional).
Contando duas espetadas por pessoa, cortamos o seitan em fatias finas, e as fatias em pedacinhos de tamanho bom para espetar. Colocamos num prato fundo ou travessa e regamos com um pouco de azeite (se tiver um pulverizador, melhor), temperado a gosto com bastante alho picado, sumo de limão e pimenta preta. Deixar a marinar enquanto prepara o resto da refeição. Quando estiver a terminar o arroz, aquecer um grelhador (de fogão ou de forno) e grelhar bem as espetadas, virando por todos os lados.
Medir ½ copo de um arroz de grão longo, tipo basmati, por pessoa. Precisamos ainda de 1 ou 2 colheres de sopa de manteiga, 1 colher de chá de sementes de coentros, 1 colher de chá de curcuma (açafrão das Índias), 1 colher de sopa (ou mais) de pinhões, 1 colher de sopa (ou mais) de pistácios descascados, coentros picados a gosto, 1/2 copo de grãos de romã, uma cenoura ralada, sumo de uma laranja.
Cozer o arroz no dobro do volume de água com sal. Aquecer a manteiga e levar ao lume para saltear as sementes de coentros. Juntar a curcuma e os pinhões. Regar o arroz com esta mistura e mexer ligeiramente (o arroz fica amarelo e branco). Mesmo antes de servir, polvilhar o arroz com os pistácios (verifique se estão bem secos, caso contrário torre-os um pouco numa sertã sem óleo), os coentros frescos picados, a cenoura ralada e os bagos de romã. Regar com um pouco de sumo de laranja e servir.
Este pão é um dos favoritos de quem viaja na Ásia, mas a sua origem é mesmo o Irão. Com estes ingredientes podemos fazer 8 naan:
½ copo de água morna, 1 colher de chá de açúcar, 1 pacote de fermipan ou similar, 2 ¼ copos de farinha, ½ copo de iogurte de soja, ½ colher de chá de sal, 1 colher de sopa de óleo.
Misturar os 3 primeiros ingredientes numa tigela e esperar até ficar espumoso (cerca de 10 minutos). Fazer um monte com a farinha, abrir uma cova e deitar lá a mistura de fermento e o iogurte, sal e óleo. Amassar até ficar suave e brilhante, cobrir com um pano e deixar dentro da tigela durante pelo menos uma hora, até duplicar de tamanho. Dividir a massa em 8 bolinhas e estende-las com o rolo da massa. Pôr uma sertã, de preferência de ferro e untada com óleo, a aquecer. Colocar o naan na sertã e virar quando começar a fazer bolhas. Assar dos dois lados e servir quente.
Bom apetite!

No longo, sinuoso e árduo percurso do auto conhecimento a dada altura as pessoas deparam-se com a palavra “Karmayoga”, uma palavra sânscrita cujo significado agora mesmo iremos ver.
A palavra “karma”[1] deriva da raiz verbal “kṛ”, que significa fazer, realizar, à qual é adicionado o sufixo “manin” que vem no sentido de “ação” ou “objeto da ação”; assim sendo, a palavra “karma” poderá significar a ação propriamente dita, ou então o objeto da ação. Na frase – “você lê este artigo”, karma poderá ser a ação “ler” ou poderá ser o “artigo”.
A palavra “Yoga”, mundialmente conhecida e tão apropriada por tantos, vem da raiz verbal “yuj”, que significa unir, conectar, juntar, focar, concentrar, e à qual é adicionado o sufixo “ghañ”, que geralmente incute o sentido da mera ação. Assim sendo, a palavra Yoga poderá significar união, concentração, foco, etc. e, secundariamente, também significa o meio, a disciplina ou o método para chegar à referida conexão ou união. Este uso secundário do significado das palavras é muito comum no nosso dia a dia. Darei um exemplo no qual o filho se dirige à mãe dizendo – “Mãe, vou para o futebol”. O menino não vai para o futebol, pois o futebol é o desporto em si. O menino vai para o treino de futebol, porém usa somente a palavra “futebol”, estando implícito que vai para o treino. Tal e qual como no exemplo mencionado, também a palavra “yoga” é usada com o seu significado secundário ou implícito. Então, neste caso Yoga significa o método, a disciplina, o meio.
[1] 4.146 – सर्वधातुभ्यो मनिन् । उणादिसुत्र.
Karma aqui significa ação. Então, o significado de Karmayoga é a disciplina da ação – a ação é usada como uma disciplina, como um meio para obter um determinado fim.
“Professor, mas qualquer ação é para obter um determinado resultado ou fim, poderia ser mais claro?” Sim, claro. Sendo óbvio que toda a ação é feita com um determinado objetivo, caso contrário ninguém agiria, a palavra “Yoga” traz uma dimensão diferente e mais profunda à ação. O objetivo de ter uma disciplina da ação é desenvolver uma atitude perante a ação. Esta é uma atitude muito peculiar que, podemos dizer, marca o início da vida espiritual – é a atitude de querer crescer emocionalmente, de querer ser uma pessoa madura e conectada com o Todo, com o Absoluto, precisamente através da ação.
Qual a ligação entre a ação, a atitude e o Todo? Śrīkṛṣṇa na Bhagavadgītā explica de forma brilhante esta relação –
यतः प्रवृत्तिर्भूतानां येन सर्वमिदं ततम् ।
स्वकर्मणा तमभ्यर्च्य सिद्धिं विन्दति मानवः ।। १८.४६ ।।
yataḥ pravṛttirbhūtānāṁ yena sarvamidaṁ tatam |
svakarmaṇā tamabhyarcya siddhiṁ vindati mānavaḥ || 18.46 ||
V.18.46 – Tendo reverenciado com as suas próprias ações (deveres) esse (Īśvara), de quem a criação dos seres (vem) e por quem tudo isto (o universo inteiro) é permeado, a pessoa obtém sucesso (preparação da mente, elegibilidade para o estudo de Vedānta).
Este é um verso maravilhoso no qual Īśvara, o Todo, é apresentado como a causa de tudo, sendo também imanente a tudo o que vemos. Īśvara é a grande ordem universal, composta por todas as leis, conhecidas e desconhecidas, que tornam este universo tal e qual como ele é, tornando-o possível de ser estudado.
Esta grande ordem universal é composta por sub-ordens, como por exemplo a ordem biológica, que rege todos os fenómenos biológicos e que é objeto de estudo dos biólogos. Temos a ordem fisiológica, a meteorológica, a psicológica, oftalmológica, etc. Todas as “logias” estudam a sua respetiva ordem. A Psicologia estuda a ordem psicológica, que rege toda a psique. A Biologia estuda a ordem biológica e assim por diante. Veja, somente porque existe uma ordem psicológica é que é possível a existência da Psicologia e de psicólogos, que se dedicam precisamente ao estudo dos fenómenos psicológicos e à forma de como estes se relacionam entre si, resultando em muitas teorias comportamentais, pelas quais é possível prever o comportamento de um ser humano numa dada situação. Se um ser humano for abusado violentamente em criança, é previsível que virá a desenvolver algum tipo de trauma. Um psicólogo encontrará a relação entre o estado psicológico atual do cliente e o abuso sofrido no passado. Esta relação só é possível porque há uma ordem psicológica.
A palavra ordem remove definitivamente o conceito errado de que o universo é um mero caos que se vai manifestando ao acaso. O Universo não é um caos. O universo é regido por leis que não foram criadas por humanos, pois já ca estavam muito antes de nós, e irão certamente continuar depois de nós. Os cientistas, todos eles, estudam estas leis, equacionando-as e cristalizando-as em teorias, teoremas, fórmulas matemáticas, fórmulas químicas, físicas, etc., para que possamos todos compreender melhor como funciona este mundo, está orgânica e inteligente máquina cósmica.
O computador, telefone ou tablet no qual está a ler este artigo é a prova material de todo esse estudo já equacionado, já cristalizado e posto ao serviço da humanidade. Pare um pouco e aprecie agora todo o estudo, toda a descoberta e cristalização deste conhecimento universal que está presente na forma de leis descobertas pela humanidade. A humanidade está a cada momento a descobrir as maravilhas deste Ser Universal chamado Īśvara, o Todo ou o Absoluto.
Momento a momento Īśvara revela-se
Sendo Īśvara o conjunto de todas as leis que formam todas as sub-ordens pertencentes a uma Grande Ordem Universal, Īśvara é todo o conhecimento, sendo a fonte, a origem de todo o conhecimento. Não só Īśvara é todo o conhecimento, Īśvara é também todo o material de que este mundo é feito. Este Universo físico que experienciamos é o corpo físico de Īśvara. Então, tudo o que está a acontecer neste momento, em qualquer parte do Universo, é Īśvara a revelar-se, é Īśvara a expressar-se; é a dança Śiva, quando Śiva é chamado de Naṭarāja, o Rei dos dançarinos, sendo o Cosmos a sua dança.
Quando apreciamos que tudo é Īśvara, que todas as situações de vida que presenciamos, desde a simples ida ao supermercado, ao apreciar romântico de um bonito pôr-do-sol, são Īśvara, a nossa atitude perante o Universo muda, pois existe a visão de que o Universo é o corpo desse Ser Absoluto.
Īśvara é a Harmonia Universal
Ao analisarmos o Universo reparamos que ele tende para um equilíbrio, que ele está num estado de equilíbrio dinâmico, existe uma força para a harmonia. É assim externamente e internamente também. Cada um de nós procura trazer mais harmonia para a sua vida, obviamente de acordo com o conceito individual de harmonia que certamente cada um tem. Este senso ou estado de harmonia está intimamente ligado com o revelar-se de Īśvara. Quando eu sinto que estou no lugar certo à hora certa na presença das pessoas certas, eu sinto harmonia. Eu estou em harmonia quando faço aquilo que é esperado de mim. A cada nova situação de vida, algo é esperado de mim, que ou o ator, aquele que deverá cumprir o seu papel respeitando o guião. Uma mãe fica em harmonia quando desenrola o seu papel de mãe. Um pai também. O filho também. Cada papel que surge na vida a dada situação – e temos muitos papeis – invoca uma dada atitude e um dado comportamento, que deverá estar alinhado pela Ordem Universal chamada de Dharma. Quando o alinhamento entre o que é esperado de mim e o que eu acabo por fazer se dá, então há harmonia, então eu estou alinhado com o Dharma.
Muitas vezes aquilo que a pessoa quer ou gostaria de fazer não está de acordo com o Dharma, simplesmente porque o prazer é preferível ao dever para a maior parte das pessoas. Assim é porque as pessoas desconhecem os benefícios do dever. Por dever quero dizer o referido alinhamento com o Dharma, que é essencialmente uma resposta objetiva, ética, e até moral, ao que me é pedido. Se me encontro numa situação privilegiada de poder ajudar outro ser humano, então o dever será prestar ajuda, e isso poderá implicar ter de deixar de fazer o que me dá prazer. Se um familiar ou amigo está no hospital devido a doença, o dever será ir visitar essa pessoa querida, embora apeteça desfrutar de um passeio no parque ou à beira mar. A sensibilidade para interpretar qual o dever a ser realizado a cada situação, chamado de svadharma, (o dever de cada um), e a firmeza para o fazer, é muito importante para o desenvolvimento emocional da pessoa, porque é uma forma muito segura de neutralizar as paixões e aversões, que são causadoras de sofrimento e muitos outros problemas, como por exemplo os crimes passionais violentos, que são devidos a apego ou aversão extremos, imbuídos de uma possessividade estranguladora e ódio doentio, respetivamente. Se a cada situação de vida tivermos em mente a visão de que Īśvara está a revelar-se a cada segundo, de que está a comunicar connosco a cada momento, então oferecer a Īśvara a resposta adequada na forma do próprio dever é mais fácil e também é libertador, trazendo consequentemente paz. Esta oferta do svadharma, do próprio dever, é um dos fundamentos do Karmayoga e chama-se Īśvara-arpaṇa-buddhi; buddhi aqui é atitude; arpaṇa é oferecimento; Īśvara-arpaṇa-buddhi é a atitude de oferecer as suas ações a Īśvara – aquilo que é esperado de mim, isso eu faço, e isso é o oferecimento.
Portanto, Karmayoga é o reconhecimento constante de Īśvara em cada situação de vida, em cada pessoa, em cada animal ou planta, acompanhado da resposta adequada e apropriada a cada situação, tendo em vista a maturidade emocional, que se faz invariavelmente necessária para o entendimento da mensagem de Vedānta.
Assim sendo, Karmayoga implica que haja uma mudança de foco. O foco deverá passar do resultado da ação para a ação propriamente dita, porque a ação depende de mim, o resultado não. Eu tenho a liberdade de agir, de não agir ou de agir diferentemente daquilo que Īśvara espera de mim, porém, o resultado dessa ação não depende de mim. Eu posso decidir ir de avião para a índia, ou de carro, ou até de trotinete, pois a decisão é tomada por mim. Quanto ao resultado já não tenho escolha. Poderei conseguir ou não conseguir chegar à Índia. O resultado desejado é chegar, mas se chego ou não, não depende somente de mim. É neste ponto do entendimento que é necessário falar de outra atitude fundamental do karmayoga chamada de Īśvara-prasāda-buddhi; buddhi aqui é atitude; prasāda é aquilo que recebemos de volta dado por Īśvara, no final de uma pūjā, um ritual de oferecimento. Prasāda é também tudo o que vem de Īśvara, e como tudo vem de Īśvara, porque tudo é Īśvara, tudo é prasāda. Assim sendo, seja qual for o resultado de uma ação, este deverá ser visto como prasāda. Esta atitude traz uma certa tranquilidade para a pessoa relativamente ao resultado da ação, porque a pessoa progressivamente vai treinando a aceitação, e com isso diminuindo o poder destrutivo e perturbador das paixões e aversões.
Geralmente, quando agimos apenas focamos o resultado, pois somos treinados assim e isso leva muitos a cometerem crimes, a não olharem a meios para a obtenção dos fins que tanto e obceessivamente desejam, o que é oposto e prejudicial a uma vida de crescimento emocional e espiritual. Quando a ação é feita não respeitando o dever e somente seguindo o prazer, seguindo a paixão ou a aversão, estamos a fortalecer as nossas paixões e aversões, e a perder a capacidade de as gerenciar, de ter uma palavra a dizer sobre elas. Porém, quando as ações são feitas tendo em vista o dever, portanto respeitando o Dharma, a Ordem Universal, aprendemos progressivamente a gerenciar as paixões e as aversões, e com isso fortalecemo-nos emocionalmente e nutrimos a nossa personalidade espiritual. O mundo passa a ser o altar sagrado chamado Vida, onde ofereço as minhas ações como meio de crescimento. A sensibilidade para apreciar Īśvara aumenta, a sensibilidade para interpretar o que é esperado de mim aumenta, a capacidade de agir inteligente e objetivamente respeitando a Ordem Universal aumenta e com isso o coração vai ficando mais e mais apaziguado, pois a pessoa deixa de ser ver como uma mera consumidora, passando a ver-se como uma contribuidora e passando, portanto, a apreciar a sua grandeza interna, que é a dádiva e o privilégio de poder contribuir para a Harmonia Universal. É neste coração grande que a mensagem de Vedānta encontra o seu lar, e assim que lá chega, lá sempre permanece.
Uma receita fora do comum e bonitinha, ideal para dar alguma excitação a uma refeição mais vulgar, como entrada. Ou então como petisco, a acompanhar um vinho fresco, verde ou branco.
O ingrediente central, a jaca, é uma fruta tropical rica em ferro, fibras, cálcio, fósforo e vitaminas, pobre em gorduras e colesterol. Como o interior é carnudo e de sabor suave, este fruto é muito procurado na cozinha vegetariana mais tropical – em Portugal só mesmo enlatado, em lojas como a www.lojavegetariana.pt.

Tal como com o tofu, podemos dar-lhe o sabor que quisermos e aqui optei por um caril a meu gosto, um pouco forte e picante.
Quanto à parte crocante, usei uma das minhas massas favoritas: as folhas de brick, que encontramos nos supermercados mais bem fornecidos, ou grandes superfícies. Esta massa muito fina permite fritar ou assar (eu asso) e mantém o crocante durante mais tempo do que, por exemplo, a massa filo.

1 lata de jaca em conserva
1 colher de sopa do nosso caril favorito
1 cebola pequena e 1 dente de alho picados
óleo de coco ou de azeite q.b.
2 colheres de sopa de polpa de tomate
cerca de 200 ml de água
1 embalagem de folhas de brick
Opcionais: sal, piripiri ou outro picante, coentros picados
Aquecer o forno a 200 Cº.
Retirar o conteúdo da lata, escorrer e desfiar ligeiramente a jaca com um garfo. A jaca já vem cozinhada, o caril é apenas para fazer um pouco de molho – não muito – e dar sabor.
Fazer o estrugido com a cebola e óleo de coco/azeite. Após uns minutos, juntar o caril. Mexer mais um minuto ao lume e adicionar a jaca. Envolver bem e regar com a água e polpa de tomate. Deixar ferver um par de minutos e temperar com sal e piripiri a gosto.
Retirar da embalagem uma folha de brick. Geralmente são circulares, por isso, o mais simples é colocar uma colher de sopa de caril, com o mínimo de molho, no centro do círculo, polvilhar com coentros picados (opcional) e enrolar num cone.
Repete-se até acabar as folhas, colocando cada uma num tabuleiro de forno, forrado a papel vegetal ou idêntico.
Pincelar os cones com óleo/azeite e levar ao forno até estarem louros. Servir quente ou frio, acompanhado de pickles, chutney …

A Ana tem-se dedicado ao jornalismo de viagem. Conta já com publicações em revistas portuguesas e espanholas, publicou também um livro de viagens (Onde os Rios têm Marés) e tem outro em preparação.É nas montanhas e nos desertos que se sente em casa. Com as viagens combina outra das suas paixões: comida vegana e é sobre isso que nos fala neste artigo.
Apesar de estarmos na era da informação e da comunicação, anda aí grande confusão com o que é, ou não, comida vegana.
Cada vez mais restaurantes, supermercados, marcas de comida e programas de cozinha tentam colar-se à palavra vegan ou vegano, às vezes daquela forma caricata de quem se quer juntar a uma moda para apanhar os clientes do nicho – mas sem saber sequer do que se trata. Exemplos: apresentar uma receita como vegan num canal de TV, que afinal leva mel; pregar uma etiqueta VEGAN em pacotes de sal, como se a coisa já não fosse evidente…
Hoje em dia a comida vegan vende-se associada a saúde, fitness, a ginásios que vendem proteína em pó com um grande VEGAN no pacote. A popularidade deve-se à escolha deste tipo de alimentação por atletas de alta competição que desejam melhorar o seu rendimento físico, e traz credibilidade e fama à palavra e ao conceito. A ideia que fica é que vegano é sinónimo imediato de saudável, mas honestamente, não é o caso.
Ou seja: se eu comer um pacote de batata frita ou de qualquer desses aperitivos hiper salgados e carregados de gordura vegetal hidrogenada, estou a comer comida vegana. Saudável? Nem por isso…
Podemos acrescentar doces carregados de açúcar refinado e comidas excessivamente processadas. Veja-se o caso de muitos cereais de pequeno-almoço, que consistem num grão integral descascado, a que se juntou artificialmente muitos dos nutrientes que já existiam na casca (ferro, cálcio, etc.), enquanto se lhe dá uma forma mais atrativa e se junta açúcar, muitas vezes como segundo ingrediente.
Claro que retirando os produtos de origem animal da comida comum, sobretudo carne e laticínios, já se ganha muito a nível de saúde. Mas é bom lembrar que a comida vegan é apenas uma parte de um estilo de vida o mais “descentralizado” possível, onde a preocupação não é a saúde do indivíduo, mas o rasto de destruição natural, sofrimento e exploração que uma só espécie – a humana – está a deixar à nossa volta.
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