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Dor na prática de yoga

Texto de Catarina Mota

 

Durante as aulas, uma das minhas “funções” é motivar os alunos para que se desafiem e percebam que, muitas vezes, os limites que têm são mais mentais que físicos. Na prática de asana é muito comum ver alunos que se sentem derrotados antes mesmo de tentar executar alguma postura, ou desistirem facilmente ao menor sinal de esforço porque se deixam levar pelo pensamento: “não consigo”.

 

Também é minha função garantir que pratiquem em segurança. Por isso, se às vezes “insisto” para que aguentem a permanência na postura ou para que tentem variações mais avançadas, também vou sempre relembrando que é essencial estar atento ao corpo, ouvir os seus sinais e respeitá-lo. Não é à força que conseguimos melhorar e evoluir na prática de asana. A máxima “no pain, no gain“, muito utilizada na actividade física, não se aplica ao yoga. Na minha opinião, não se deveria aplicar a nenhuma actividade física, já que nos ensina que, sem sofrimento, não atingimos os objectivos. E não é bem assim.

Tem de haver um equilíbrio entre desistirmos ao primeiro sinal de esforço e permanecermos num ásana a todo o custo, mesmo que o corpo já esteja a dar sinais de que devemos parar.

 

Os extremos são fáceis. O equilíbrio é sempre mais difícil de alcançar e implica estarmos realmente presentes na prática e percebermos os sinais.

 

A dor é um desses sinais. Pode-se dizer que há dois tipos de dor: uma “positiva” e uma “negativa”. A “positiva” nem considero que seja dor. É a sensação que temos quando estamos a alongar e sentimos os músculos a esticar, desde que não seja levada ao extremo, desde que respeitemos os limites do nosso corpo e alonguemos da maneira certa, produz uma sensação agradável.

A “negativa” é a dor que não tem nada de agradável! Quando estamos a praticar e sentimos dores agudas, como picadas, seja nos músculos ou no interior das articulações, nunca é bom. Pode ser um sintoma de alguma lesão ou pode ser devido a má execução do exercício. Em qualquer dos casos, devemos desfazer a postura imediatamente, relaxar um pouco e tentar de novo. Se a dor desaparecer, tudo bem. Se a dor persistir, não devemos insistir no exercício, pelo menos naquele momento.

 

Praticar com a atitude correcta é meio caminho andado para que a prática seja segura:

– atenção focada na prática

– auto-observação constante

– respiração consciente

– manter a serenidade e uma atitude de “não esforço”, mesmo que o corpo esteja em esforço, interiormente

 

A verdadeira prática é a que fazemos por dentro. Se nos lembrarmos disso não damos tanta importância a executar a técnica a qualquer custo, como se estivéssemos numa competição.

 

Devagar se vai ao longe. Quando não temos pressa para chegar onde quer que seja e nos focamos em fazer o caminho da melhor forma possível acabamos por chegar mais depressa (onde quer que seja).

 

Quando não respeitamos o nosso corpo pela pressa de atingir alguma posição ou porque temos uma atitude competitiva, em relação aos colegas, ou até mesmo a nós próprios, etc, damos um passo para a frente e dois para trás. O corpo vai ficar dorido ou até mesmo lesionado, atrasando a nossa evolução. Se praticamos “devagar e sempre”, respeitando os nossos limites do momento, cuidando do nosso corpo como se fosse o nosso bem mais precioso (será que não é mesmo?), não teremos problemas e estaremos no bom caminho para uma vida mais saudável.

 

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O que é o yoga

Texto de Filipa Mora

Filipa Mora é licenciada em comunicação social e jornalismo. É também instrutora de yoga e colaboradora do Atria Yoga na produção e revisão de conteúdos.

 

 

O que é o Yoga?

Expressar por escrito o significado de Yoga no meu percurso é por si só um desafio. Tal como o Yoga o é para mim. Um desafio, perante mim própria, o meu ego e perante o mundo e os outros.

 

No início foi a respiração. Tentar iniciar um ciclo respiratório pelo abdómen não era propriamente novidade, dada a minha formação profissional e necessidade de o fazer para colocar a voz e fazer locução. O desafio era mesmo conseguir aliar tudo isso aos movimentos de forma “correcta”. Lembro-me de até tonturas ter nos primeiros adho mukha que fiz…e coordenar tudo? Bolas, que trabalheira, que confusão…Então o yoga não era concentrar para abstrair? E conseguir fazê-lo?

 

Nos primeiros tempos era tão difícil conseguir dedicar a atenção a tudo, da mesma forma que era difícil não pensar no que ia fazer para o jantar a seguir, no dia que tinha tido e nos pormenores das coisas que tinham acontecido e, enfim, vinham os pensamentos mais idiotas à mente. Vá, confessem, quem é que nunca pensou no jantar, na conversa com o amigo, na coisa pendente que tinha de fazer, na lista de compras esquecida na mesa da cozinha, enfim, uma série de coisas “importantíssimas”, na altura, logo naquele momento em que estamos em cima do tapete e em que “bastava” a concentração na respiração, alinhamento/postura e no mergulho por dentro que é uma prática de asana

 

Se aquelas primeiras aulas de yoga tivessem um cartoon, seria uma implosão de pensamentos e de coisas a que queria estar atenta. A melhor metáfora que me ocorre das primeiras aulas de yoga é como quando estamos a aprender a conduzir. Até que determinadas coisas entrem em modo “piloto automático”, ui, que confusão que era! O alinhamento, a respiração, a coordenação da respiração com movimentos… e atrever-me e desafiar-me a fazer a aula toda sem me frustrar, ui! As primeiras aulas de yoga foram isso mesmo: aprender a lidar e gerir a frustração perante mim própria, nesse mergulho para dentro que representava aquela hora de prática.

 

Sentar-me com as costinhas “direitas” e respirar. Parece fácil, não? Humhum, pois. Até podia ser se todas as rotinas que estão embrenhadas em nós não nos conduzissem na direcção contrária. Passamos grande parte do dia, ou ao PC, tortos, ou de pé e com a bacia desencaixada, ou enquanto andamos, sempre com a cervical inclinada para o telemóvel, ao qual não damos descanso. Chegar a uma aula de yoga depois de um dia de 8/9h de trabalho e com as preocupações diárias que a rotina assim “exige”, nem sempre é “fácil”. Quando a aula termina, é uma delícia e invade-nos sempre aquele pensamento “ainda bem que vim!”, mas sair do trabalho, atravessar a confusão do trânsito de final do dia (pensar no trânsito ainda pós-laboral que se irá apanhar depois da aula!), chegar lá e começá-la, nem sempre é a coisa mais sedutora do mundo… por mais que amemos e nos dediquemos à nossa prática, por mais que nos esforcemos e mesmo em alturas em que temos perfeita noção que se não formos àquela aula, dificilmente iremos compensar a prática em casa. Ufa, que correria. (Fiquei cansada só de escrever estas últimas linhas, eheh…)

 

Ora bem, para nós que andamos aqui no lufa-lufa da cidade e ainda conseguimos ir a uma aulinha às 19h00, só sentar no tapete uns minutos para aquietar é um desafio gigante. A cabeça não pára, é assim que a habituámos há muito tempo. Não há botões mágicos, nada. Só mesmo a nossa concentração, essa sim, consegue coisas e efeitos mágicos. É como tudo na vida, uns dias melhor, outros pior. Portanto, atrevo-me a dizer que por mais anos que passem e se ganhe espaço, se melhorem posturas, flexibilidade, etc, aquilo que a minha caminhada me tem mostrado é que é TUDO impermanente, tal como a forma como olhamos para o mundo, para o yoga e como praticamos, claro.

 

No meu trilho pessoal, já tive alturas em que praticava asana duas vezes por dia e agora que olho para esses tempos, reconheço que fazia tudo menos yoga. Fazia posturas e mexia o corpo, é certo, mas a minha cabeça não estava alinhada com o coração, mas sim com o ego. Estava numa boa condição física (como nunca pensei que o yoga permitisse!), tinha bastante tempo livre e a prática de asana matinal e ao fim do dia tornou-se, praticamente, uma obrigação. Mas…ficava com um sentimento de culpa estranho, caso não praticasse. Ora bem, isso não será violentar-me? Não se confunda disciplina com inflexibilidade e intolerância. Lá está, o limbo entre o equilíbrio e desequilíbrio é aquele ponto que não se vê, quase, mas que existe. Um bocadinho mais para o lado e caímos, daí a dificuldade em mantermo-nos no meio. Se fosse fácil, não precisávamos de passar a vida toda a aprendê-lo. Ainda que, também, por vezes, seja necessário ir aos extremos para se descobrir o que não se quer e ir algures ali até ao meio.

 

Yoga para mim é consciência, é ter a humildade de olharmos para dentro, mas aquele dentro em que cumprimentamos o “ego” – reconhecemo-lo mas não o alimentamos nem focamos a atenção unicamente nele – e tomamos consciência de nós e dos outros.  De nós com os outros e com o mundo em geral. Yoga é vestirmos o papel de observador a toda a hora, mas sem que isso represente uma obrigação, é algo que se vai tornando quase que inconsciente, por mais paradoxo que possa soar. É uma consciência constante e permamente nesta impermanência da vida, nestas rotinas em piloto-automático, em que agimos de forma quase que desligada de tudo e de todos.

 

Yoga é respirar consciência, observação, humildade e a tão bela “compaixão”. E parece um paradoxo, da mesma forma que é necessário concentrarmo-nos para nos abstrairmos ou estarmos atentos a nós de tal forma para nos conseguirmos observar e tentar compreender e ter compaixão perante o próximo. Afinal, só um “desapego” e uma “acção verdadeiramente desinteressada” nos vai conduzindo a qualquer lugar melhor que este.

 

A música que agora ouço enquanto escrevo é de Fink e chama-se “Truth beginse o refrão refere algo como “Layers on layers, layers on layers. The journey unravels, and the truth begins, begins, begins”. E o yoga anda de mãos dadas com a vida como se de camadas se tratasse. Se cada passo que damos é mais uma camada que acumulamos a outra e a tantas outras camadas e camadas de caminhadas e aprendizagens, em algum momento percebemos que não percebemos nada mas que a quietude é o melhor amigo das dúvidas, do receio, do apego… O olho do furacão é sempre o local onde as condições atmosféricas são mais amenas… Eis que a “verdade” aparece. A nossa verdade, o que faz sentido para nós, a forma honesta e tranquila de estar na vida, perante os desafios e as dificuldades e o sofrimento. Se nos desapegarmos dos apelos constantes a que o nosso ego reage pelos estímulos todos lá de fora, do dia-a-dia, seremos, sem dúvida, mais verdadeiros connosco próprios.

 

Yoga não são só asanas (ainda que durante muito tempo tenha pensado que sim), não é sentar de pernas cruzadas, respirar e fazer “jñána mudrá”, emitir o som “Om” e desejar paz para nós, os outros e o universo.

 

Não é perpetuar clichés nem continuar a dizer aquilo que o Yoga não é (ou não deveria, pelo menos, ser!). Podia também lançar a provocação que é só arranjar tempo para respirar e expandir, mexer o corpo, já que é o nosso veículo para essa mesma expansão e viagem e, pronto, só falta alinhá-lo com a mente. Afinal, trata-se “apenas” de unir o coração e a mente. O que fazemos para o conseguir é a caminhada da vida… E talvez partamos sem o conseguir fazer mas, pelo menos, existe a intenção (e acção!) de viver conscientemente.

 

A descoberta do que andamos para aqui a fazer, do que é poder viver conscientes, fieis e verdadeiros connosco e com os outros. Amar de forma livre e incondicional, passar a ver a vida e a vermo-nos de outra forma. Não necessariamente de forma oposta à que vivíamos antes mas, por norma, os vários relatos e histórias que ouvimos, referem-se sempre a um “antes” e “depois” do yoga na vida das pessoas.

 

Há mesmo quem mude radical e repentinamente e passe a rejeitar todas as rotinas e processos desenvolvidos até à introdução ao yoga. Há variadíssimos desabafos e textos sobre as mudanças e alterações na vida de cada um, é comum referir-se a forma como se olha para a vida e isso pode implicar a alimentação, as rotinas diárias, até mesmo os amigos e companhias que sempre fizeram sentido para nós, tal como determinados padrões comportamentais. E, de repente, mergulhamos numa bolha cujo timing depende de cada um… e as mudanças se podem ser subtis e vão acontecendo tão internamente que, quando se sentem, são enormes.

 

Há quem não consiga abdicar de todos os hábitos de outrora, há quem os mude totalmente. Há quem se afaste do círculo de amigos habitual e passe a não conseguir gerir antigas relações, há quem deixe de fazer determinados programas, há quem aprenda a gostar de estar sozinho e há quem passe a apreciar e a aperceber-se do quão necessário é ouvir o silêncio.

 

Pode haver, também, uma fase em que durante a descoberta desta forma de ver o mundo – como se tudo fosse mais transparente aos nossos olhos e estivéssemos mais conscientes e sensíveis ao mundo em geral e, quase que paradoxal e simultaneamente, mais abstraídos dos impulsos desse mesmo mundo – nos julgamos mais atentos que os outros. Ora bem, lá está o ego a pregar-nos uma partida.

 

“Ego” talvez tenha sido a palavra que mais ouvi da boca do meu primeiro e querido professor de yoga… “ego” para aqui, “ego” para acolá… e como o significado atribuído às palavras varia em função, quer das áreas de estudo, quer do contexto, eu lá me questionava sobre algumas coisas que a Psicologia me dizia… Não há problema em ter ego, aliás, temos de o ter, desde que não o deixemos conduzir-nos por esse mundo fora. Senão, a visão que temos sobre o mundo será sempre de dualidade, de separação: de nós e dos outros.

 

E o que o Yoga me tem ensinado, enquanto forma de viver, é exactamente o oposto. É união. Sem querer cair em redundâncias, talvez tentar explicar o que é Yoga parta mim seja mais fácil do que julguei…(como se a simplicidade não trouxesse consigo toda a complexidade do processo até lá…). Se escrevo estas coisas (num registo bem oral, diga-se de passagem), talvez seja porque me revejo plenamente nestes processos todos.

 

Enquando continuo a escrever, continuo a ouvir Fink, desta vez, uma música em que ele colabora com Bonobo (“If You Stayed Over”) e que tem uma passagem: “Breathe in the future, breathe out the past”, curioso como esta metáfora poderia ser utilizada, se o passado representasse as preocupações e lições aprendidas e o futuro, apenas as coisas boas, as expectativas, a esperança.

 

Mas daqui podemos sempre saltitar para outra questão: e por que não inspirar e expirar o presente, apenas? Claro que a construção do que somos é a soma de tudo o já fomos, mas não dispendemos demasiada energia a pensar no passado e a projectar o futuro? Andamos sempre aos trambolhões de expectativas e furacões de emoções… Se yoga é, também, a consciência de tudo “aqui e agora”, se não há mais nada além disso, se tudo é impermanente, então que estejamos a 200% no agora porque é a única certeza que temos, é de estarmos aqui.

 

Consciência, liberdade, verdade, permanência, evolução, caminhada, luz …são palavras que associo ao Yoga. Felicidade e consciência. E a (tão tramada por tão difícil que é, por vezes!) compaixão que vem com a aceitação.

 

Yoga é respirar contemplação, abraçar o sol da consciência e viver de forma mais livre, tolerante, flexível e feliz. Primeiro connosco próprios, numa lógica do desapego e sem dar grandes ouvidos aos pedidos do ego e, depois, com os outros e o universo em geral. E tudo vem por acréscimo…pensar em várias opções e tentar ver o mundo de outra perspectiva. Não é só quando estamos no tapete, numa invertida, que vemos o mundo ao contrário. É preciso fazê-lo sempre que os desafios destes novos ritmos nos preguem sustos.

 

Yoga é arranjar espaço dentro (e de dentro para fora) de nós. Expandir a caixa toráxica, a capacidade respiratória, a flexibilidade, a força, etc, claro…

 

E expandir, acima de tudo, a consciência… e o coração.

 

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